Matutina Meiapontense: primeiro jornal do Centro-Oeste do Brasil

Museu da Família Pompeu – Casarão do século XVIII, onde, em 1830, funcionou a sede da Matutina Meiapontense. Foto: Adriano César Curado

Um capítulo especial da história da imprensa periódica no Brasil, no século XIX, foi protagonizado pela Matutina Meiapontense, primeiro jornal da Província de Goiás, na vila de Meia Ponte (Pirenópolis). Sua primeira edição circulou no dia 5 de março de 1830, quando ainda reinava Dom Pedro I, despertando a consciência cívica nos sertões do planalto central. O título do jornal não poderia ser melhor: matutina é aquele toque de corneta usado para acordar quem ainda dorme em berço esplêndido, protelando o início de mais um dia de trabalho.

O abastado fazendeiro Joaquim Alves de Oliveira fez uma longa viagem à corte do Rio de Janeiro e lá comprou uma boa tipografia, incluindo um prelo manual importado da França. Contratou tropeiros de plena confiança para transportar a preciosa carga em lombo de mulas para a vila Meia Ponte. Acertou com o padre Luís Gonzaga de Camargo Fleury para que ele assumisse a redação do jornal que circulou por aproximadamente cinco anos, totalizando 526 edições.

No setor de periódicos da Biblioteca Nacional é possível acessar uma centena de edições digitalizadas da Matutina Meiapontense, que funcionava como “diário oficial” das províncias de Goiás e Mato Grosso, publicando editais e documentos diversos. Como na época ainda não existia jornal em Mato Grosso, a Matutina publicava a coluna Miscelânia Cuiabanense, noticiando os eventos da sociedade mato-grossense.

Além dos recursos necessários para comprar a tipografia, da cultura literária do padre redator, nada teria acontecido sem o trabalho do tipógrafo Francisco José de Melo, contratado para imprimir o jornal. Aliás, esse experiente tipógrafo está também na história da imprensa do Mato Grosso. Foi ele quem montou a primeira tipografia de Cuiabá, para imprimir a Themis Mattogrossense, primeiro jornal do Mato Grosso. Além de montar o prelo, ele ensinou a arte da tipografia para um grupo de rapazes que se tornaram nos primeiros oficiais impressores da cidade.

Ao analisar as cartas de leitores publicadas pela Matutina, é possível identificar traços marcantes do pensamento da elite escravista da época, sempre solicitando mais benefícios pagos pelos cofres imperiais. A grande maioria da população não sabia ler nem escrever. O conceito de instrução pública somente começaria a germinar ao final do Segundo Reinado, com a ideia de instrução popular, iniciando a lenta expansão das poucas escolas primárias públicas existentes no interior das províncias.

Finalmente, cumpre acrescentar que a pioneira Matutina iniciou sua trajetória, com um editorial em defesa da “liberdade de imprensa”, por vezes, fazendo críticas ao que entendia ser alguns equívocos cometidos pelo imperador Pedro I e pelos políticos mais atuantes no Período Regencial. Desse modo, seja no tempo do primeiro jornal goiano ou contexto da atualidade, a imprensa livre é uma das condições fundamentais para a manutenção e expansão de todas as forças e instituições democráticas do País.

Por Luiz Carlos Pais – professor aposentado da UFMS

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