Enquanto os vizinhos Mato Grosso e Goiás têm dois clubes na 1ª Divisão do Futebol Brasileiro deste ano – Cuiabá e Goiás -, os clubes de Mato Grosso do Sul estão na 4ª Divisão há décadas e sem qualquer perspectiva de melhorar de patamar nas próximas décadas. A falência do futebol sul-mato-grossense teve, em um intervalo de quatro dias, dois exemplos de que a mais tradicional modalidade esportiva do Brasil chegou ao fundo no poço em nível estadual.
Os dois mais tradicionais clubes de futebol do Estado – Operário e Comercial – tiveram desempenhos nesse curto intervalo de tempo, enquanto o “Galo” de Campo Grande foi goleado e, consequentemente, eliminado da Copa do Brasil 2023, o “Colorado” da Capital perdeu para o seu maior rival e caiu para a 2ª Divisão do futebol sul-mato-grossense.
Se na década de 70 e 80 do século passado os dois times eram protagonistas da modalidade no Estado e no Brasil – o Operário chegou a ficar em 3º lugar no Campeonato Brasileiro -, desde a década de 90 ambos são motivos de vergonha para os seus ainda fanáticos torcedores. Os famosos clássicos “Comerários” deixaram de ser motivos de orgulho para se transformar em motivos de chacota.
Os dois mais tradicionais clubes de Campo Grande perderam o protagonismo e viram os adversários do interior de Mato Grosso do Sul assumirem esse lugar de destaque. O Galo ainda dá consegue oscilar entre boas e más campanhas, conquistando um título estadual de vez em quando – inclusive é o atual campeão estadual -, porém, o seu principal rival vem definhando ano após ano e, agora, finalmente caiu para a Série B do Campeonato Estadual.
Feudo
No entanto, a culpa não é só da má gestão de ambos os clubes, a FFMS (Federação de Futebol de Mato Grosso do Sul) tem a maior parcela da falência do futebol estadual. Também não é de se estranhar, afinal o presidente Francisco Cezário de Oliveira está à frente da entidade desde o fim da década de 1980 e, para desespero dos amantes do futebol no Estado, no fim do ano passado foi reeleito para o quadriênio 2023-2027, sendo seu oitavo mandato alternado.
Nas mãos de Francisco Cezário, o futebol sul-mato-grossense foi definhando década após década, enquanto os clubes dos Estados do Mato Grosso e de Goiás foram se fortalecendo e subindo de divisão até alcançar a Série A do futebol brasileiro. Entretanto, a culpa não é só do dirigente, pois, por pior que ele seja para o futebol local, foi o único que se prontificou a concorrer pelo cargo novamente, sendo foi reconduzido por unanimidade.
Com 76 anos de idade, na sua primeira fala como presidente reeleito, lembrou do detalhe da coincidência de datas, já que foi reconduzido no mesmo dia do seu aniversário. “Vocês [dirigentes dos clubes votantes] me dão esse presente mais uma vez. A minha responsabilidade e meu carinho por vocês aumentam a cada dia. Neste período que convivemos, não somente pelas nossas situações às vezes mal compreendidas ou mal colocadas, por sermos essa família única e que tenho a honra de ser o líder de vocês com meus colegas de diretoria. Eu tenho sempre dito que o futebol existe por causa de vocês”, disse, sem anunciar qualquer tipo de plano para resgatar o futebol local.
Copa do Brasil
O último lampejo de glória do futebol estadual, por ironia do destino, foi o atual campeão sul-mato-grossense, o Operário, que pela primeira vez avançou de fase na Copa do Brasil. Porém, o sonho não durou muito, pois, na fase seguinte foi goleado por 5 a 0 pelo CRB no último dia 15 de março.
Apático em campo, os alvinegros sequer conseguiram ameaçar a equipe da casa, que abriu o placar logo aos seis minutos de jogo com gol de cabeça de Anselmo Ramon. Cinco minutos mais tarde, Mike ampliou a vantagem dos alagoanos novamente em lance de bola parada.
Com dois gols na bagagem em cerca de dez minutos de partida, o Operário em nada ameaçou o CRB, e chegou com Travassos somente aos 17 minutos, finalização para fora. No minuto seguinte, Renato aproveitou a assistência de Anselmo Ramon para marcar o terceiro dos mandantes.
Integrado ao galo de campina no fim de 2022, o atacante marcou novamente aos 22 minutos após bela assistência do lateral de Matheus Ribeiro e aos 39 em falha defensiva dentro da pequena área alvinegra. O confronto foi a primeira vez que Mike marcou três gols em um único jogo.
Não bastasse o saldo negativo, o Operário viu Johnny, autor do gol que classificou os sul-mato-grossenses, sair lesionado logo aos 34 após sentir uma lesão na parte posterior da coxa. Mesmo feito que tirou Leomir do gramado.
Na volta do intervalo, sem mobilidade ofensiva e qualquer tipo de reação, o clube buscou recompor o sistema defensivo, integrando um terceiro zagueiro na última linha do campo.
Com o duelo resolvido numericamente, o CRB buscou administrar o placar construído na primeira etapa, ao passo em que deu minutagem aos jovens jogadores do elenco.
Em ritmo de treino, ambas as equipes mantiveram o respeito e realizaram uma segunda etapa bastante protocolar aos olhos dos torcedores que estiveram no Estádio Rei Pelé, em Maceió, capital alagoana.
Os alvinegros se despedem da competição com R$ 1,7 milhão em prêmios e voltam às atenções para o clássico diante do Comercial no próximo domingo (19). Em baixa por conta da derrota sofrida, o alvinegro pode rebaixar o grande rival em confronto válido pela 10ª e última rodada da primeira fase do Estadual.
Rebaixamento
Se está ruim para o Galo, para o Colorado a situação é ainda pior. O Comercial perdeu para o seu maior rival e foi rebaixado para a Série B do Campeonato Sul-Mato-Grossense de Futebol pela primeira vez em sua história. A situação vexatória do Esporte Clube Comercial, segundo time com o maior número de títulos (9) do Campeonato Estadual, já era prevista, em decorrência da crise financeira pela qual o Colorado passa no futebol desde 2017.
A partida, disputada no Estádio Jacques da Luz, na tarde de ontem (19), pela última rodada da fase de grupos do Estadual, terminou com o placar mínimo de 1 a 0 para o Operário, com gol do atacante Kaique Marcial aos 29 minutos do segundo tempo. Sem vitórias há oito jogos, o Comercial só escaparia do rebaixamento se vencesse o Operário no clássico “Comerário” e se o Coxim perdesse para o Costa Rica.
Nenhum dos dois possíveis resultados se concretizou e o Colorado amarga o rebaixamento para o Campeonato Sul-Mato-Grossense Série B 2024. Em entrevista no fim da partida, o presidente do Comercial, Cláudio Barbosa, ressaltou que a crise financeira do Colorado vem se agravando desde 2017. “Não vamos guardar nenhuma boa lembrança desse Estadual. Começamos mal e até conseguimos trazer alguns atletas, mas infelizmente não foi suficiente. Para fazer futebol, precisa ter dinheiro, e a situação financeira do Comercial começou a desandar em 2017”, declarou Cláudio Barbosa.
De acordo com o presidente do clube, é necessário mais apoio ao Comercial, para que o clube monte um planejamento para retornar à elite do futebol sul-mato-grossense. “Precisamos de apoio, críticas são bem-vindas se forem construtivas, mas agora temos de pensar no planejamento para a Série B do Estadual de 2024”.
O técnico do Comercial, Ronildo Rocha, citou em entrevista ao fim do jogo que faltou planejamento ao time neste Estadual e que era necessário mais profissionalismo no clube. “Está sendo dolorido esse rebaixamento, era algo que não esperávamos, uma situação humilhante, tivemos pouco planejamento. Teve muita coisa extracampo que dificultou também, muitos abraçaram a causa, mas não foi o suficiente para alcançar o objetivo”, disse.
Torcedores do Comercial que estiveram presentes na derrota do Colorado no clássico Comerário falaram com a reportagem do Correio do Estado sobre o momento pelo qual o clube está passando. Para Marcio Felice Ribas, 57 anos, empresário, é lamentável a situação do Comercial. “É um time tradicional de Campo Grande, tem uma história, mas é lamentável a situação financeira e do time em si. O treinador é inexperiente, não serve para ser técnico, somando tudo isso, infelizmente, o Comercial caiu”, disse.
Sabendo que precisava da vitória, o Colorado não se intimidou e, logo nos primeiros minutos da partida, conseguiu criar duas oportunidades de gol. Em cobrança de falta para o meio da área do Operário, o zagueiro Henrique Mumu, do Colorado, subiu mais alto e tentou abrir o placar de cabeça, mas a bola parou no travessão do Galo.
A segunda chance do Comercial foi com o camisa 10, Eduardo Samler, que conduziu a bola e finalizou rasteiro na entrada da grande área; o goleiro Samuel do Operário saltou na bola e fez uma bela defesa. Mesmo começando bem a partida, o Comercial não conseguia manter a posse da bola e, com isso, o Galo chegou ao ataque em diversas oportunidades, com bolas levantadas na área.
No segundo tempo, os 45 minutos foram menos intensos do que o primeiro tempo. Com poucas chances claras de gol, a partida se encaminhava para terminar com um empate sem gols. Porém, em contra-ataque rápido do Galo, aos 29 minutos, o Operário pegou a zaga colorada toda desajustada, Jeferson Reis deu um passe para o atacante Kaique Maciel, que o deixou cara a cara com o goleiro Breno, e Kaique finalizou na saída do último defensor para estufar as redes.